Like the Phoenix i rise
From the ashes of life
I don’t need fortune or fame
Just some peace of mind

(Stratovarius – Phoenix)

Ofuscado por um raio de sol, Mash’al acordou com um sobressalto. Ao longe, o canto de algum pássaro tropical se ouvia, e o aroma de ervas perfumadas pairava no ar. Ele estava em um aposento circular de madeira, sem fazer ideia de como havia ido parar ali. Sentando-se na  rede onde estava deitado, ele examinou o local, percebendo que a sala não tinha portas, apenas janelas com o parapeito em forma de poleiro. -“Talvez seja apenas um sonho estranho”- pensou.  Uma brisa leve soprava nas árvores no lado de fora, movendo no chão um mosaico de luzes formado pelo teto de galhos entrelaçados. Nas paredes, vários objetos curiosos estavam pendurados: cestos de palha cilíndricos, lanças de caça decoradas, contas de sementes e outra meia dúzia de redes, todas vazias.

Ainda sonolento, o garoto voltou a deitar, deixando que pensamentos dispersos ocupassem sua mente. Seu irmão mais velho havia sido assassinado na fronteira há apenas algumas semanas. Desde então, Mash’al passara a ser o herdeiro legítimo do Califa de Al-Dasht. Ele nunca havia desejado a vida palaciana, se dedicando ao trabalhos na Guilda dos Engenheiros de Mavi para poder um dia deixar sua nação isolada. Mas o destino sempre parecia já ter feito as escolhas por ele. A Rainha Ifrit, com seu terrível olhar incandescente, anunciara que era a hora dele assumir sua linhagem de sangue, ao invés de se ocupar com desejos egoístas.

Em um suspiro de frustração, ele se lembrou de que o problema ainda não terminava ali, ao vislumbrar o anel de noivado em sua mão. Amirah, a filha do Sultão de Jezirat, estava destinada a se unir a ele em um casamento diplomático das duas tribos que governavam Al-Dasht: Aswad do Deserto e Jezirat das Ilhas Distantes. A frieza e seriedade da princesa  de longos cabelos negros irritavam Mash’al profundamente, e a única coisa que os dois compartilhavam entre si era a  repulsa pela ideia de em breve se tornarem marido e esposa. Afinal, a antipatia passional do herdeiro de Aswad era correspondida pela princesa com um desprezo tão sarcástico que ele sentia suas vísceras se revirarem de ódio, e foi com um grande alívio que ele havia encontrado a esperança de ao menos por um tempo fugir daquele inferno de obrigações, conseguindo com a ajuda dos Engenheiros de Mavi uma recomendação para estudar no Instituto Marque de Sauge, na nação estrangeira de Aurin.

Enquanto ainda estava distraído em seus pensamentos, um súbito baque fez com que o garoto se revirasse na rede, caindo de cara no chão. Quando voltou o rosto na direção do som, ele viu um ser com cabeça de pássaro pousado em uma das janelas. Era um falarque, um habitante das florestas a oeste da capital governada pelo Califa. Aquele era um jovem caçador inexperiente, a julgar pelas poucas tatuagens em sua pele cor de areia. As penas alaranjadas tinham um aspecto bagunçado, e uma bandagem de linho estava amarrada em seu bico. Seus pés de gavião agarravam com firmeza o poleiro, enquanto as mãos agarravam com firmeza um arco feito da carcaça de uma grande libélula. Apesar da postura ameaçadora, seu olhar para Mash’al era o de uma ave curiosa, virando a cabeça um pouco de lado para estudar melhor as chamativas vestes vermelhas do rapaz caído.

-Pegue suas coisas rápido. Você dormiu muito. O Profeta vai falar com você – grasnou o falarque, saltando para o lado de fora.